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quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Luz "errada" ofusca maratona astronômica





EDUARDO GERAQUE
da
 Folha de S.Paulo

Quando astrônomos profissionais e amadores do mundo inteiro se juntarem a partir de amanhã para a maior maratona de observação dos céus já feita, as 100 Horas de Astronomia, enfrentarão um inimigo comum: o céu das grandes cidades do mundo, como São Paulo, que permite ver apenas a Lua e um punhado de estrelas mais brilhantes.

Por causa da poluição luminosa, os cenários urbanos estão longe do ideal para observações. No deserto do Chile, por exemplo, é possível contar a olho nu mais de 5.000 estrelas.

Transformar o panorama do céu, segundo os pesquisadores inconformados com o grande desperdício de luz, não melhora apenas o lado da astronomia. Faz bem ao bolso também.







Uma vez que é impossível eliminar as cidades, os astrônomos vêm sugerindo formas de ao menos suavizar o problema."Nós estimamos que 30% da luz que ilumina as grandes cidades seja jogada no lixo. Além de ser um problema ambiental, é também econômico. Todos estão pagando essa conta", diz o astrônomo amador Tasso Napoleão, um dos coordenadores brasileiros das 100 Horas de Astronomia, o primeiro grande evento público do Ano Internacional da Astronomia, em 2009 (leia texto à direita).



A principal delas é combater a iluminação "errada". Segundo Napoleão, trata-se da iluminação típica das ruas das cidades brasileiras. Os raios de luz acabam "vazando" para os lados e, principalmente, para o céu. Além de não iluminarem a rua (daí os 30% de desperdício na conta de Napoleão), ainda ofuscam as estrelas.

Uma conta feita no Reino Unido ajuda a dimensionar o problema. Em um ano, o país jogou fora R$ 3,32 bilhões por causa da luz "errada".

Para baixo

Por causa disso, a cidade de La Serena, no Chile, onde a reportagem da Folha esteve em janeiro, há mais de dez anos cuida da poluição luminosa por meio de luminárias públicas eficientes, que jogam a luz para o chão. As ações são regulamentadas por uma lei específica, em vigor desde 1998.

A atitude não serve só para agradar a poetas e astrônomos. Mais de 100 mil turistas visitam a região todos os anos atrás dos observatórios astronômicos amadores. Perto de La Serena, também estão instalados grandes observatórios profissionais importantes, como o Gemini Sul e o Soar.

Atitudes semelhantes às chilenas, ainda mais antigas, foram tomadas em outras cidades do mundo, onde as luzes estavam ofuscando demais o céu. As Ilhas Canárias, palco de vários observatórios europeus importantes, também seguem a linha de jogar luz só para o chão. A lei de proteção do céu na região é de 1988.

"A solução é simples. Nem precisa, muitas vezes, trocar tudo. Basta usar uma lâmpada até 30% mais fraca, com uma luminária que jogue toda a luz para baixo", diz o engenheiro Cristóvão Jacques, outro astrônomo amador incomodado com a poluição luminosa.

O mineiro caçador de supernovas controla pela internet um observatório em Belo Horizonte. 'As luzes da cidade- além do tempo nublado- atrapalham bastante as observações', diz Jacques. Segundo o engenheiro, as iluminações de outdoors e de monumentos voltadas para cima são exemplos clássicos do desperdício.

"Fiquei meio decepcionado e parei de fazer campanha contra isso", diz Carlos Alberto Torres, do LNA (Laboratório Nacional de Astrofísica). Em Brazópolis (MG) desde os anos 1970, onde fica o Observatório Pico dos Dias, Torres acompanha o aumento da poluição luminosa entre São Paulo e Minas. "Várias cidades poderiam ter uma preocupação maior. Entre elas Itajubá, Pouso Alegre e Campos do Jordão."

Existe ainda uma questão sociológica por trás da contaminação luminosa, diz Napoleão. "Nas grandes cidades, cada vez mais, as pessoas não olham mais para o céu. Elas vão se afastando da natureza como um todo", filosofa.

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